A placa do estacionamento diz: "Não nos responsabilizamos pela segurança do veículo ou por itens de valor contidos dentro dele". Ou seja, o estabelecimento está se eximindo de arcar com qualquer tipo de dano causado por um possível furto, ou até mesmo roubo do carro. Isso é correto?

Depende da situação. Na maioria dos casos, a Justiça condena o estabelecimento a indenizar a vítima quando o furto ou roubo acontece em estacionamentos privados, sejam eles pagos ou não. Advogados explicam que, ao cobrar para disponibilizar uma vaga, a empresa (um shopping, por exemplo) está automaticamente gerando uma "situação de depósito", na qual se caracteriza a prestação de um serviço e, por conseguinte, o dever de zelar pelo bem. Sendo assim, se o furto ou o roubo ocorre, há uma falha no processo.
Além disso, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê que haja indenização dos danos causados à vítima independentemente de culpa. Isso vale não somente para quando o veículo é furtado ou roubado, mas também para quando algo de dentro do carro é levado. Porém, essa situação exige comprovação, como afirmam profissionais da Drovetto Advocacia:
Fazendo prova de que estava com os pertences, a pessoa pode requerer uma indenização do estabelecimento por meio de notificação ou ajuizando uma ação, bem como pedir danos morais.
O mesmo ocorre quando o estacionamento é privado e não cobra por isso, como em um supermercado, por exemplo. Segundo a Justiça, a partir do momento em que o estabelecimento comercial oferece um local para a pessoa deixar o carro enquanto realiza compras, passa a ser responsável pelo bem. Especialistas no tema dizem que o "estacionamento gratuito" é uma espécie de ferramenta para chamar o cliente, tratando-se de uma vantagem oferecida.
É por isso que a pessoa evitaria deixar o veículo na rua e preferiria colocar no estacionamento da empresa, por acreditar ser mais seguro. A situação fica ainda mais caracterizada quando existe guarita e cancela.
E quando se trata de furto de bicicletas?
Na tarde da última sexta-feira (14), uma moradora comunicou ter deixado sua bicicleta, no bicicletário de um supermercado no bairro Menino Deus para fazer compras. Ao sair, encontrou somente a trava enrolada em um pedaço de madeira.
Ainda que em algumas cidades determinados estabelecimentos comerciais ou de interesse público sejam obrigados a oferecer espaço adequado para estacionamento de bicicletas, estabelecimentos comerciais do país inteiro têm se valido desta tática para atrair o ciclista consumidor. Isso gera dúvidas sobre os direitos de quem utiliza os espaços e de quem os oferece.
Responsabilidade sobre a bicicleta
A existência do bicicletário ou paraciclo é um atrativo para o consumidor, um diferencial que o atrai para um estabelecimento de comércio ou serviço com a finalidade de fazê-lo consumir. Assim, o espaço destinado à bicicleta no estabelecimento faz parte da relação de consumo entre o ciclista e o comerciante/prestador de serviços.
Quando paramos nossa bicicleta em um estabelecimento privado, celebramos contrato de depósito com quem oferece o espaço, devendo este restituir seu bem exatamente como entregamos a sua guarda. Na falta dele, por qualquer motivo, ele deve restituir bem igual ou a quantia de dinheiro correspondente. Lembramos que o contrato de depósito é, em regra, gratuito e se comprova por escrito.
Nesse aspecto é obrigação do fornecedor de entregar um comprovante do estacionamento ao ciclista. A falta dele é interpretada em favor do ciclista, considerando o Código de Defesa do Consumidor.
E se o estacionamento não é cobrado?
A gratuidade não influi na relação. Por sinal, a gratuidade é a regra. A jurisprudência já decidiu que, no caso dos carros, o estacionamento gratuito não é mera cortesia e sua manutenção está embutida no preço do produto/serviço fornecido. Portanto, é serviço indireto prestado ao consumidor. Inclusive, o comerciante está implicado em responsabilidade até daquilo que fornece gratuitamente, como um bombom de degustação.
E se o ciclista não consumir naquele local?
Também não tem impacto na relação. Pressupõe-se que ele estava ali para consumir, que foi atraído para aquele local para isso. Ao parar a sua bike neste estabelecimento, você conhecerá os produtos, você fará pesquisa do preço, você estará inevitavelmente nesta relação.
E se existir uma placa “não nos responsabilizamos pelas bicicletas estacionadas”?
Tal aviso não afasta a responsabilidade do comércio/prestador da responsabilidade de cuidado com os seus bens. Isso já foi matéria de discussão no que diz respeito a carros e motos e a jurisprudência é pacífica que tal aviso não tem qualquer efeito. A partir do momento em que o consumidor é atraído, este está protegido pelas regras do Código de Defesa do Consumidor. A não realização da venda não é de sua responsabilidade.
Quais são as práticas ideais?
Na falta da uma regulamentação das regras para a utilização de bicicletários, fica a cargo dos estabelecimentos e usuários estabelecerem os parâmetros. Algumas boas práticas podem facilitar as relações entre os ciclistas e os estabelecimentos.
- A entrega de bilhete ou outra forma de comprovação do estacionamento da bicicleta no local, sendo anotados horário de chegada, marca e modelo da bicicleta. Isso comprova para o ciclista a existência do contrato de depósito e limita a responsabilidade do estabelecimento ao exato objeto entregue.
- O estabelecimento pode exigir que o ciclista possua trava apropriada, mas o ideal é o sistema de duplo travamento, ou seja: uma trava do ciclista e outra do estabelecimento, sendo que o estabelecimento é responsável pela trava que fornece.
- É desejável que o local seja monitorado por câmeras e em local que dificulte o furto por oportunidade.
Como o ciclista pode se precaver?
Sabemos que nem todos os estabelecimentos estão dispostos a oferecer bicicletários dentro de práticas ideais. Assim, é importante guardar as notas fiscais da bicicleta e componentes, bem como fotografar a bicicleta e os componentes instalados nela. Ter fotos atualizadas da bicicleta demonstram o estado dela em uma eventual ação.
Se o estabelecimento não oferecer qualquer comprovante de que você deixou a bicicleta no local, o recomendado é fotografar a bicicleta estacionada, de modo que se possa reconhecer o local. As fotografias digitais têm em seu código informações de data e horário, sendo possível atestar que não foi manipulada digitalmente.
Na ocorrência de furto ou dano de sua bicicleta, informe imediatamente o estabelecimento e se necessário informe a autoridade policial e lavre Boletim de Ocorrência do fato.
Tente sempre negociar com o estabelecimento,mas caso seja necessário procure a justiça. Lembramos que nos Juizados Especiais as causas até 20 salários mínimos dispensam o auxílio de advogado, embora seja sempre recomendada a consulta ao profissional.
Estacionamento do trabalho ou em órgãos públicos
Muitos órgãos públicos oferecem estacionamentos para pessoas que precisam frequentar o local e, na maioria das vezes, de maneira gratuita. No entanto, a Justiça tende a isentar o órgão de culpa por entender que, mesmo quando há vigilantes, eles são contratados para zelar pelo bem público, e não pelo privado.
Entretanto, cada situação necessita de uma análise específica e se verificam fatos como presença de cancelas, câmeras de segurança, muros, saídas e entradas de estacionamento e vigias uniformizados. Por isso, o direito de reivindicação existe.
O mesmo ocorre quando um veículo é furtado ou roubado dentro do estacionamento da empresa onde a pessoa trabalha. Se ficar provado que o local se caracteriza como um benefício ao trabalhador, a empresa pode ser condenada a arcar com possíveis prejuízos causados. Tratam-se de indícios como maior segurança e tranquilidade do que deixar o carro em via pública, por exemplo.
Prejuízos em Zona Azul não são ressarcidos
A lógica de garantia de ressarcimento de danos em veículos não vale para as áreas conhecidas como Zona Azul, que são locais públicos onde a pessoa paga para estacionar. Segundo a Justiça, a cobrança existe para gerar controle e rotatividade das vagas em benefício do interesse comum dos cidadãos.
Clipping JMD com informações do advogado Fernando Torres e Mundo Advogados
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