Superado o primeiro mês de quarentena, Cristianne Percivale e Guilherme Gomes se sentiram sufocados no apartamento onde moram, um imóvel de 60 metros quadrados no miolo do bairro Menino Deus, em Porto Alegre. O escritório adaptado no quarto de hóspedes se mostrou apertado, e a ausência de uma área ao ar livre se tornou claustrofóbica.

Até o gato, Oliver, acostumado às manhãs e tardes solitárias, deu sinais de estresse por causa da companhia constante do casal. Dispostos a se afastarem da área central da cidade em busca de mais espaço, Cristianne e Guilherme compraram uma casa ampla em um condomínio, situado no bairro Agronomia, a 10 quilômetros do atual endereço.
– Antes, não sentíamos esse confinamento, porque passávamos o dia inteiro na rua. Mas, na pandemia, percebemos que o tamanho era insuficiente. Aí, abrimos mão da localização para termos o convívio com a natureza – conta Cristianne, que é consultora de franquias.
Em meio às rotinas familiares transformadas pelo coronavírus, o casal não está sozinho na procura por imóveis maiores, abastecidos por um lugar ao sol e, se possível, um gramado para chamar de seu. A ordem de isolamento motivou uma disparada na demanda por casas no Rio Grande do Sul pela camada mais rica da população que, imune à crise financeira, está apta a investimentos.
Segundo representantes do setor, o coronavírus modificou, em poucos meses, uma tendência consolidada do mercado imobiliário. A preferência por apartamentos compactos, instalados em condomínios de bairros centrais e com enorme infraestrutura coletiva, deu lugar à predileção por residências espaçosas localizadas em áreas mais retiradas da cidade. Itens como sacadas e unidades garden, com um pequeno jardim no térreo, também passaram a ser prioridade.
– Havia uma inclinação ao compartilhamento de quase tudo que diminuiu com a pandemia. Esse isolamento prolongado revalorizou a moradia, ampliando o desejo de melhora da qualidade de vida pelo contato com a natureza. Agora, os clientes pedem pátio, sacada e uma bela vista – assinala Aquiles Dal Molin Júnior, presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil do Estado (Sinduscon-RS).
Na prática, o confinamento imposto pelo risco de contágio antecipou planos que estavam reservados para o futuro. Cristianne e Guilherme, por exemplo, discutiam sobre o anseio de mudança para uma casa assim que tivessem o primeiro filho. O cotidiano circunscrito às paredes do apartamento, somado à disponibilidade financeira, apressou a decisão antes da chegada de um bebê.
Pelo calendário do casal, a instalação no imóvel de três andares, que tem mais do que o dobro da metragem do atual, está prevista para dezembro. Até lá, Cristianne idealiza as estantes de sua futura biblioteca, que será em um escritório isolado da área social, e a estrutura de lazer que montará no gramado do quintal:
– Depois que isso tudo terminar, nossa vida não será mais a mesma. Estamos realizando um sonho.
Alta na venda de casas de até 67%
Duas das principais imobiliárias do Rio Grande do Sul confirmam, em seus relatórios, a tendência seguida por Cristianne e Guilherme. Na Foxter, a venda de casas disparou 67% de maio a julho em relação ao primeiro trimestre deste ano, saltando de 36 para 60 unidades. Já nas coberturas, a alta foi de 91%, e, nos terrenos, de 267%.
– Há uma mudança de prioridades. Se antes as pessoas preferiam áreas de infraestrutura, condomínios com forte apelo de design e em bairros mais nobres, elas passaram a valorizar mais o seu ninho, da porta para dentro. Buscam imóveis maiores, com ambientes mais bem divididos e contato com a natureza, que deem a sensação de liberdade e a possibilidade de pé na grama – afirma o sócio-diretor da Foxter Fernando Erhart.
Fechadas ao longo de meses por força dos decretos de distanciamento social, imobiliárias tiveram de se adaptar para atendimentos a distância. Pela demanda de clientes, a Guarida Imóveis investiu em visitas virtuais, nas quais potenciais consumidores podem até medir a largura de paredes, e produziu transmissões ao vivo de imóveis pelas redes sociais.
Clipping JMD com foto de Jefferson Botega / Agencia RBS e informações de Débora Ely / GaúchaZH
0 Comentários